No dia 14 de Julho de 2018, a conta Twitter de António Marinho e Pinto publicou o que parece ter sido o seu tweet mais viral até à data: “online pharmacy viagra”. Em declarações à SÁBADO, o eurodeputado afirma que “foi pirateado por ‘tecnófilos'”.
Boot: loading arrogance
A postura de António Marinho e Pinto denota frequentemente uma condescendência tudóloga. Numa situação pela qual ele é responsável, decide ignorar esse facto e culpar “tecnófilos” e “mujiques“, o que apenas contribui para demonstrar a arrogância de alguém cujas “convicções políticas nunca estiveram em leilão político, nem estarão seja qual for o número de votos que possa ter”.
No mundo de Marinho e Pinto, talvez “I.A.” represente “ignorância e arrogância”. E embora não venda as suas posições em leilão, raramente são as mesmas devidamente justificadas, como menciona um artigo do Shifter.
Testemos então se as suas convicções assentam em falsas preposições e assunções ignorantes (spoiler: assentam). Num simples tweet:
O tiro no pé
Graças à Wayback Machine do Internet Archive, um dos inúmeros benefícios de uma Internet livre (algo que desagrada ao eurodeputado), ainda podemos ver várias consequências do tiro que o próprio Marinho e Pinto deu no pé:
À primeira vista, ou é uma conta troll, ou foi usurpada de algum modo por alguém que não é o Marinho e Pinto… mas ninguém usurpou nada, e ninguém foi vítima de fraude.
Quanto muito, o eurodeputado pirateia-se a ele mesmo.
Facto: Marinho e Pinto não foi pirateado
Poderíamos colocar a hipótese da conta @marinhopintoeu não ser realmente uma conta oficial do eurodeputado (por exemplo, não está verificada) mas sim alguém fazendo-se passar pelo mesmo. No entanto, já se sabe que tanto a conta Twitter como o site em questão são realmente do eurodeputado.
A empresa que criou o site em nome de Marinho e Pinto (TJ-Multimedia) basicamente abriu um WordPress, instalou uma versão idêntica ao tema que usa no próprio site, e uma série de plugins (funcionalidades extra que se podem instalar no WordPress para vários propósitos).

Aparentemente, um destes plugins terá sido instalado para que Marinho e Pinto (ou uma das pessoas que tem como assistente) pudesse publicar notícias. Ou seja, sempre que se publicasse uma nova notícia no site, a mesma era enviada como um tweet publicado pela conta de Marinho e Pinto.

O problema: a página do site onde se publicam estas notícias era pública. Consequentemente, qualquer pessoa poderia aceder à mesma e criar uma notícia (i.e. criar também, automaticamente, uma publicação de Marinho e Pinto no Twitter).

A TJ-Multimedia, empresa que desenvolveu o site de Marinho e Pinto “conta com mais de 20 anos de experiência no ramo de audiovisuais, nos sectores de Video, Som e Luz Profissional” e não duvido do seu talento nestas áreas… no entanto, em relação a boas prácticas e/ou segurança online, já não poderei considerar tal possibilidade.
Podemos culpabilizá-los por aceitar um trabalho que, sobretudo sendo para um eurodeputado, poderia ter sido feito por alguém com um pouco mais de experiência para evitar este tipo de situações. E a responsabilidade poderá ser maior ao verificar-se que o plugin foi instalado sem o conhecimento do eurodeputado.
Por outro lado, se eu tenho um site em meu nome, qualquer pessoa poderá legitimamente assumir que o utilizo pessoalmente. Se Marinho e Pinto não consulta o seu próprio site, não o explora, e sobretudo se não sabe como funciona (não sabe), creio que também tem a sua dose de culpa para digerir.
Ainda digo mais.
Isto foi uma brincadeira de crianças comparado com o que realmente dava para fazer.— Tomahock (@tomahock) July 16, 2018
Se algo muito mais grave tivesse acontecido, a culpa seria da TJ-Multimedia? Não: a culpa seria de Marinho e Pinto; a culpa desta situação foi de Marinho e Pinto, e esta é uma responsabilidade que o mesmo tem de assumir e que não pode vender em leilão.
Reboot: loading ignorance
Declarações à SÁBADO
Permitam-me rever e comentar as declarações que Marinho e Pinto deu à Revista SÁBADO.
“Foi pirateado.”
Falso, como demonstrado acima. Isto é, pura e simplesmente, mentira.
Há necessidade de haver controlo na Internet.
De acordo… tal como há esta necessidade em qualquer outro meio, digital ou não, onde as pessoas tomem acções que ponham em causa a sua integridade física ou psicológica, tal como a dos outros. Pelo que, enquadrando no presente assunto, com um maior controlo na Internet, a página de Marinho e Pinto não deveria ter sido sequer publicada. Isto porque:
- É claramente insegura, não respeitando regras básicas de segurança online.
- Coloca a imagem pública do eurodeputado em risco (acrescendo a potencial ridicularização em praça pública).
- Possibilitou facilmente uma utilização fraudulenta da mesma como veículo de adopção de identidade do eurodeputado. Consequentemente, colocando em risco os seguidores online do mesmo.
A Internet está ocupada por hordas de mujiques e enquadrados por legiões de técnofilos.
Sem comentários.
O advogado pediu já para que o problema (…) seja tratado (…) mas, diz, “não com muita pressa para as pessoas verem como actuam essas hordas de mujiques e esses militantes da tecnologia, os tecnófilos”.
Quanto maior o atraso na correcção destes erros, maior a infracção. Consequentemente, mais grave o tiro no pé. Esta arrogante teimosia é uma péssima estratégia.
“O que digo a essas pessoas é que as minhas convicções políticas nunca estiveram em leilão político, nem estarão seja qual for o número de votos que possa ter.”
Embora não entenda exactamente o que quer dizer com “leilão político”, Marinho e Pinto parece declarar que é alguém que não muda de opiniões. A sua teimosia parece superar a sua inteligência.
Pessoalmente, não confio em indivíduos que não estejam dispostos a aprender com os seus erros (mais importante, penso duas vezes antes de depositar neles a confiança de um voto).
Uma postura a considerar
Embora já seja tarde demais, a resposta de Marinho e Pinto poderia ter sido completamente diferente (ainda que impossível dado o seu feitio).
Alguns exemplos de pontos que poderiam ter sido apresentados em declarações:
- “Reconheço que solicitei a terceiros sem experiência a criação do meu site e que não supervisionei devidamente o resultado desse trabalho. Consequentemente, algumas boas prácticas poderão ter sido negligenciadas pelo prestador do serviço.”
- “Admito que o erro específico em si poderia ter sido utilizado com desígnios maliciosos, muito além da brincadeira geral à qual assistimos.”
- “Estou já a tomar medidas para corrigir estas falhas, tendo contratado outro prestador com a devida experiência neste assunto, e o site estará offline até ficar assegurado que esta ou outra situação idêntica não se repete.”
- Bónus: “reconheço também que, caso houvesse um maior controlo da Internet dentro dos termos que costumo defender, neste momento teria de enfrentar pesadas sanções por ter colocado o meu público em risco.”
Conclusão
Uma coisa é certa: o conhecimento actual do eurodeputado sobre a Internet e as suas liberdades, direitos e deveres inerentes, aparenta ser bastante medíocre.
Esta situação não só nos convida a reflectir sobre os indivíduos que temos a representar-nos, como sublinha a necessidade de uma educação básica no que diz respeito à Internet e aos nossos direitos e deveres online.
Portanto, se Marinho e Pinto contribui pessoalmente para a propagação de falsidades sobre situações pelas quais é directamente responsável, a sua “I.A.” sobrepõe-se a qualquer outro valor de carácter. Não duvido que possua outros valores, mas provavelmente estão ainda em germinação. Ou, citando o próprio Marinho e Pinto:
